Aline Bardy Dutra, 45 anos, conhecida nas redes sociais como Esquerdogata, foi presa em Ribeirão Preto no sábado, 25 de outubro de 2025, por volta das 23h, após um embate com policiais militares durante uma fiscalização de trânsito. A prisão, segundo a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo (SSP-SP), ocorreu sob acusação de desacato, resistência e ofensas racistas — mas o que parecia um simples flagrante virou um caso nacional, com repercussões que vão muito além da rua.
Do Instagram à cela: quem é Esquerdogata?
Aline Bardy Dutra não é apenas uma influenciadora. Ela se apresenta como educadora, militante política e criadora de conteúdo com propósito. Com mais de 870 mil seguidores no Instagram, ela construiu uma marca que mistura moda, crítica política e mobilização. Sua loja online vende peças com frases como "Democracia não é opcional" e "O sistema não quer que você pense". Filhada ao Partido dos Trabalhadores desde maio de 2022 — e confirmada por Folha de S.Paulo e Metrópoles —, ela nunca ocupou cargo oficial no partido, mas usa sua plataforma para atacar figuras como o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, e defender aliados como os deputados Carlos Zarattini e Lindbergh Farias.O que aconteceu na noite da prisão?
Segundo relatos da SSP-SP, durante uma abordagem de rotina, Aline teria se recusado a apresentar documentos e proferido frases consideradas ofensivas aos policiais, incluindo comentários que a polícia classificou como racistas. Um dos agentes, segundo a delegacia, ouviu dela: "Você acha que sua sandália vale o carro de vocês?" — uma frase que, em seu contexto, parece ser uma crítica à desigualdade social, mas que, naquele momento, foi interpretada como provocação. O caso foi levado à audiência de custódia no mesmo dia. A Justiça de São Paulo, ao invés de manter a prisão, concedeu liberdade provisória com medidas rigorosas: recolhimento domiciliar noturno, proibição de aproximação de policiais envolvidos e, principalmente, a obrigação de comprovar, a cada dois meses, que está em tratamento psiquiátrico. A defesa informou que Aline é diagnosticada com transtorno bipolar e usa sertralina e quetiapina. O prazo das medidas: um ano, até outubro de 2026 — a menos que o juiz decida diferente.Um processo paralelo: a batalha com Nickolas Ferreira
Enquanto o caso de desacato tramita em Ribeirão Preto, outro processo corre na 1ª Vara Criminal de Brasília. Em fevereiro de 2025, Aline publicou um vídeo em que acusava o deputado federal Nickolas Ferreira (PL-MG) de ser "um dos responsáveis pelo maior esquema de lavagem de dinheiro do tráfico de drogas". Ela o apelidou de "Chupetola" — um termo que, para ela, era uma crítica política. Ferreira entrou com ação por difamação. A defesa de Aline insiste: "Não houve intenção de injuriar, apenas de denunciar". Mas a linha entre crítica e calúnia está cada vez mais tênue — e o Judiciário está sendo testado.
Por que isso importa para o Brasil?
Este não é só um caso de polícia e influenciadora. É um espelho da polarização que vive o país. Aline é uma voz que ecoa entre jovens que não confiam nas instituições tradicionais. Ao mesmo tempo, ela é vista por muitos como uma provocadora que usa o discurso de esquerda para justificar excessos. O governador Tarcísio de Freitas, seu principal alvo, já usou o caso para reforçar sua narrativa de "combate à anarquia". Enquanto isso, movimentos de direitos humanos questionam: será que uma mulher negra, com histórico de transtorno mental, foi tratada com a mesma dignidade que um político branco, com influência, receberia em situação semelhante? O incidente ocorre em um momento crítico: as eleições municipais de 2026 estão a menos de um ano. Aline já disse, durante a prisão, segundo o UOL: "Isso me fará uma deputada federal". E talvez ela esteja certa. O caso transformou uma influenciadora em símbolo — de resistência para uns, de caos para outros. O que era um post no Instagram agora vira debate no Congresso, nas universidades e nas rodas de família.O que vem a seguir?
A defesa de Aline já anunciou que vai recorrer das medidas cautelares, especialmente o tratamento psiquiátrico obrigatório — que, segundo advogados, pode configurar violação de direitos humanos. Enquanto isso, a Polícia Militar de São Paulo mantém o inquérito aberto para apurar se houve abuso de autoridade por parte dos agentes. O Ministério Público de São Paulo está avaliando se a acusação de racismo tem base suficiente para avançar. E o deputado Nickolas Ferreira, por sua vez, aguarda a decisão da Justiça sobre sua ação de difamação — que, se vitoriosa, pode resultar em pena de até dois anos de prisão para Aline.
Um caso que não vai embora
O que começou como uma abordagem de trânsito em uma noite de outono em Ribeirão Preto virou um marco na relação entre redes sociais, poder e justiça no Brasil. Aline Bardy Dutra, ou Esquerdogata, não é uma política tradicional. Mas sua história revela algo profundo: no mundo digital, quem tem voz pode se tornar alvo — e, paradoxalmente, também símbolo. O Brasil está dividido. E ela, agora, está no centro.Frequently Asked Questions
Por que Aline Bardy Dutra foi presa se não tem cargo público?
Ela foi presa por desacato e supostas ofensas raciais durante uma abordagem policial, não por seu cargo — que, aliás, não é público atualmente. A lei brasileira permite a prisão em flagrante por crimes como desacato e ameaça, independentemente da condição social da pessoa. O fato de ela ser influenciadora ou militante não a protege da aplicação da lei.
O que significa o tratamento psiquiátrico obrigatório como medida cautelar?
A exigência de comprovar tratamento psiquiátrico a cada 60 dias é uma medida judicial que visa garantir a saúde mental da ré, mas também serve como forma de monitoramento. Embora seja comum em casos de transtornos psíquicos em que há risco de comportamento agressivo, especialistas questionam se isso não configura uma forma de estigmatização, especialmente quando a acusação de racismo ainda não foi comprovada.
O caso de Nickolas Ferreira pode afetar o processo de desacato?
Não diretamente. Os processos são distintos: um é criminal, em São Paulo, por desacato e racismo; o outro é de difamação, em Brasília, por declarações políticas. Mas a repercussão de ambos alimenta a narrativa de perseguição política, o que pode influenciar a opinião pública e até decisões judiciais, mesmo que tecnicamente sejam independentes.
Aline Bardy Dutra pode se candidatar a cargo político mesmo com medidas cautelares?
Sim. A Lei da Ficha Limpa não a impede, pois não há condenação penal transitada em julgado. As medidas cautelares não são condenações. Ela pode se candidatar a deputada federal em 2026, desde que cumpra os requisitos legais — e mesmo com o recolhimento noturno, isso não é um impedimento constitucional para disputar eleições.
Por que o caso ganhou tanta atenção da mídia?
Porque une vários elementos sensíveis: política, raça, classe, redes sociais e poder policial. Aline representa uma nova geração de ativistas digitais, enquanto a PM representa o Estado. O confronto entre eles reflete tensões profundas do Brasil pós-2018. O vídeo dela na prisão, com a frase sobre a sandália, viralizou porque toca na dor da desigualdade — e isso é o que move as redes hoje.
O que especialistas dizem sobre o uso de termos como "Chupetola" em discursos políticos?
Juristas e cientistas políticos divergem. Para alguns, termos pejorativos são parte da retórica popular e da crítica política, especialmente em contextos de desconfiança nas instituições. Para outros, isso normaliza a desumanização e facilita a violência simbólica. O STF já decidiu em casos semelhantes que a crítica política tem proteção constitucional, mas não se estende a acusações falsas de crimes graves — como lavagem de dinheiro.
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Leandro Moreira
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